Todos sabem que há no chamado “meio literário” a contracorrente linguística (um
certo desvio na estrutura da língua portuguesa) de chamar poetisas de qualidade
de "poeta", pondo o termo como comum de dois gêneros (muito provavelmente
partindo do famoso poema de Cecília Meireles, em que ela se diz poeta). Mas
isso, a meu ver, se deve simplesmente à característica masculina do idioma:
quando dizemos “Todo homem é igual em direitos e obrigações”, abarca-se homens e
mulheres. Entretanto, fazer o quê? Tende-se à divisão “mulher poeta” e a simples
“poetisa”, esta última como sendo qualquer mulher poetastra.
Esta breve
introdução, faço-a despretensiosamente, sem obviamente o desejo de ir fundo na
questão; é somente para dizer o seguinte sobre Márcia Sanchez Luz:
Ela é
POETA: pois primeiro arquiteta a si e ao mundo utilizando-se de projetos
inteligentes, refletidos, estando acima da questão controvertida acima disposta
– pois que hoje sabemos valer verdadeiramente a capacidade profissional da
pessoa, não importando se é homem ou mulher; depois, Márcia edifica a verdadeira
poesia com materiais-palavras de construção de qualidade e fortaleza; e então,
por final, para e mira sua obra, a flertar com a excelência que os gênios da
arte exibem com naturalidade.
Mas Márcia também é POETISA, sim, a quebrar
o paradigma das tendências ordinárias e superficiais, por ser ela toda feita de
feminilidade, mas de feminilidade séria, não piegas, exacerbando da
sensibilidade própria das mulheres fêmeas na alma, e que não têm medo de mostrar
isso a quem quer que seja. Assume o risco por saber quem é e a que veio, por
estar completa em si, no âmago, em sua intelectualidade.
Ao sonetar
ininterrupta, digna e belamente, Márcia demonstra-nos, então, como é possível
sermos livres diante dos aprisionamentos da vida, a que todos estamos
submetidos. Ela consegue transitar plenamente liberta na difícil forma fixa que
a espécie de poema que ela mais domina normalmente impõe. Sua poesia tem técnica
e sensibilidade, é arquitetura e paixão: por isso Márcia Sanchez Luz é, para
mim, POETA e POETISA!
Fabbio, você escreve muito bem, e tem sempre aquela ampla visão de mundo que eu gosto tanto. Não é à toa que sua poesia me sensibiliza profundamente pela acurada percepção e originalidade. Então acho excelente o fato do poeta e da poetisa virem reunidos em uma só pessoa, através de você, especialmente em se tratando-se de Márcia. Perfeito. Quanto menos dicotomizarmos o mundo, menos nos esgarçaremos. E acho ótimo também você ter levantado a lebre do "(...) a simples "poetisa", esta última como qualquer mulher poetastra"; mesmo quem escreve poesia romântica sem técnica (mulher ou homem) não deveria receber esta pecha, esta conotação pejorativa por causa disso, porque, como todo julgamento de valores, tachar uma literatura de inferior é muito subjetivo - em geral as pessoas que fazem isto não se baseiam em nenhum outro critério se não o achismo. Só a prática da poesia faz de qualquer poetastro/a um poeta/poetisa. Ou os dois, como você belamente propõe. Nascemos poetastras/os e com treino chegamos alguns a ser poetas e poetisas, a observar o movimento do mundo (exterior e interior) com atenção e respeito, como a "poiesis" grega fazia. Ou então, jogo semântico que prefiro, nascemos todos poet/astros, só que muitos poetas acabam gravitando apenas em torno de seus anéis... Um ótimo texto, Fabbio. Um texto ótimo.
ResponderExcluirNão importam, para o diamante, os rótulos... seguirão sendo essência, independentemente de quaisquer devaneios.
ResponderExcluirMárcia, todavia, goza de privilégio raro conquistado aos deuses: é Musa...